sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Nona edição do Guia de escalada de Brejo da Madre de Deus - PE

Saiu a nona edição do guia de escalada de Brejo da Madre de Deus, local em que conquistei/participei de grande parte das vias:

http://escaladape.blogspot.com.br/2014/09/guia-de-brejo-atualizado-download.html

Excelente pico de escalada.

O Guia é obra de Caui Vieira, conquistador e parceiro em muitas vias.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

EXPEDIÇÃO ACONCÁGUA - ROTA NORMAL

Face Sul do Aconcagua, visto de Plaza Flancia.

Após muitas leituras sobre escalada alpina e expedições, decidi experimentar! Foi muito difícil escolher a montanha, já que eu não possuía nenhuma experiência em escaladas deste tipo. Sempre admirei escaladores como Valdemar Niclievics, Anatoli Bukrev, Appa Sherpa, Reinhold Messner, entre outros, e queria experimentar tudo o que lia e ouvia em seus relatos e reportagens que saiam sobre os mesmos.
Bem, decisão tomada, optei pelo Aconcágua 6.972m, por ter uma excelente infraestrutura e apoio de algumas empresas para na rota normal, não tinha ideia do que encontraria, a não ser por alguns videos que vi no You tube, o melhor foi "Aconcágua Sin Mulas", relatos que li mas só que de montanhas maiores, e um único livro em português que encontrei sobre esta rota, mas que não acrescentou muito, tentei também conversar com algumas pessoas que conheço e que estiveram no local, mas não se mostraram muito dispostos a falar sobre a experiência. Este é um dos motivos que me leva a escrever algo sobre esta escalada.

Decidi escalar, participando de uma Expedição Comercial Aberta... putz, mas o que isso significa? Bem, é uma expedição, organizada por empresas especializadas, que fornecem toda a infraestrutura coletiva(translado, acompanhamento na obtenção de licenças, assessoria no aluguel de equipamentos, alimentação, mulas, porteadores, barracas durante a escalada, guias especializados na montanha a ser escalada)...pessoas do mundo inteiro, pagam o valor estipulado por todos estes serviços e marcam a data de inicio, os clientes, só se conhecem no primeiro dia da expedição.

Na minha humilde condição de zero experiência, era a opção mais segura, mas descobri durante a expedição que não foi a melhor escolha, mais abaixo relato o porque.

É possivel alugar/comprar todo o equipamento, pagar a taxa da permissão, emitir permissão, tudo no mesmo dia, fiquei em um hotel NH Hotel, a loja que aluguei equipos fica a uma quadra deste, e tem outras opções tudo a no máximo 5 quadras.

Aluguei praticamente todo o equipamento e roupas necessários, na loja www.aconcagua6962.com, pois como no Brasil não faz tanto frio como em uma montanha dessas, e eu não sabia se iria gostar ou não de escalar em altitudes elevadas, segue lista abaixo, esta lista, é o que eu levei, e não o que um escalador de alto nível levaria:


Pés:
04 pares de meias sintéticas fina(comprei)
04 pares de meia grossa, tipo as que se usam para ski(reservei duas para usar acima dos 6000m, pois dizem que meias novas, isolam melhor que usadas)-(comprei)
01 bota leve goretex da salomon, senti muita falta dela no acampamento de 4900m, deixei no campo base.(já possuia)
01 par de polainas.(aluguei)

Pernas:
02 primeira pele fina
01 calça de abrigo brossa, com reforço nos joelhos e bolso, (esta eu utilizei muito) - (Aluguei).
01 calça de goretex, só usei acima dos 4900m - (Aluguei)
01 bermuda

Tronco
04 camisetas primeira pele.(comprei)
01 jaqueta Makalu(utilizei muito) excelente.(aluguei)
01 jaqueta de plumas de ganso. (aluguei)
01 anorak. (aluguei)
senti falta de um fleece fino

Cabeça
01 Boné com aquele negocio que vai até o pescoço. (Comprei)
01 óculos com tapa sol no nariz e ao lado dos olhos. (Aluguei)
01 gorro com tapa orelha. (este foi usado muito, e só comprei porque o guia sugeriu, ainda bem). (comprei)
01 tubo de tecido fino e 01 grosso, utilizado para proteger o pescoço, as vezes boca e nariz, e no frio extremo até a cabeça.(comprei)
01 capacete. (aluguei, o guia da expedição exigiu, então leve o seu, pois tenho um meteor III e tive de utilizar um camp com o dobro do peso).

Mãos
1 par de luva de seda. (comprei), não usei
2 pares de luvas interiores. (comprei)
1 mitenes. (Aluguei)

Material expedição
1 Protetor solar
1 Garrafa térmica inox de 1 litro
03 Nalgene, utilizei um para mijar e dois para beber, como me hidratava muito a noite, achei pouco.
03 pares de aquece mãos
03 pares de aquece pés
01 isolante termico
01 colchonete auto inflavel (este foi a melhor coisa que comprei, um show, indicação do guia)
Material de higiene pessoal, lenços umedecidos principalmente
01 head lamp, levei só dois jogos de pilha, um terminou no inicio da expedição, sorte que Padre Mário levou de sobra e me deu um jogo para repor.
Louças, esqueci da caneca, tive de pegar uma emprestada, pois faz falta demais
01 saco de dormir de pluma de ganso para -35 graus. (aluguei)
3m de cordelete de 3mm, só eu levei, ajudou muito, principalmente secando as minhas cuecas e primeiras peles no acampamento base.
Loja de Equipamentos onde fui muito bem atendido

Equipamento Técnico:
01 mochila de 80 litros, aluguei uma ruim, me arrependi demais. (aluguei)
01 par de botas duplas, aluguei da scarpa, um numero maior que o meu pé, desnecessário este detalhe, tive de usar 2 meias grossas para fica mais confortável. (Aluguei)
01 par de bastões para trekking.
01 Picareta. (aluguei)

Custo do Aluguel dos equipamentos: 2.500,00 Pesos Argentinos, neste dia o Dolar valia cerca de 4,1 pesos.

Em Mendoza, deve-se pagar a permissão, que na temporada que escalei custou 3.000 pesos. Basta perguntar na loja de Equipamentos que o pessoal informa o local, após pagar a taxa, ainda tem de tirar a permissão, que é em outro lugar, vá sempre se informando, não esqueça que são dois passos, paga em um local, e retira a permissão em outro.

Depois do equipo alugado, permissão na mão, partimos para Puente Del Inca.

Ponte dos Incas


Em Punta Del Inca, as cargas são despachadas pelas mulas, é só procurar o galpão da Aymara(tem outras opções também), fica ao lado da feirinha de artesanato. Detalhe, você pode despachar o material todo a Plaza de Mulas, neste caso, terá de carregar o que for utilizar em Confluencia desde Puente Del Inca até Plaza de Mulas, optamos por mandar o material para Confluencia e depois pagar mulas novamente de Concluencia a Plaza de Mulas, assim nossas mochilas ficaram muito mais leves, somente com lanche e roupas a serem utilizadas nas caminhadas até os acampamentos.

Cemitério dos Andinistas


É recomendável passar uma noite ali, já se está a 2700m. Pode-se visitar o cemitério dos andinistas, visitar a Ponte dos Incas, e comprar alguns artesanatos na feirinha.

Pousada que ficamos em Puente Del Inca
Após uma boa noite de descanso, fomos para a entrada do parque, apresentamos as permissões e iniciamos o trekking até o acampamento de Confluencia 3300m, ir com dois trekking poles, facilita muito as caminhadas.

Inicio da caminhada para Confluencia
 A caminhada segue pelo meio de montanhas e um belo visual...


Achei a caminhada tranquila, paramos algumas vezes.

Chegando em Confluência 3400m

Acampamento de 3400m

Em Confluência, a água é "carregada de minérios", segundo fui informado, o que faz mal ao intestino, já no dia seguinte a chegada neste acampamento fiquei com uma diarreia liquida, nem liguei no primeiro dia, foi um erro não me medicar, quase não consegui comer nos 02 dias e mais 02 dias em Plaza de Mulas devido a este mal estar.

No dia seguinte a chegada, fizemos mais uma caminhada, de umas 8 horas de ida e volta, até Plaza Flancia 4100m, lugar maravilhoso, com vista para a face sul do Aconcágua, um sonho...






Ao retornar da caminhada, minha diarreia continuava, fui ao medico, minha pressão estava alta, oxímetro 95, fui medicado, e não melhorei....

No dia seguinte, desmontamos acampamento, despachamos a carga pelas mulas, e iniciamos a caminhada para Plaza de Mulas, 4300m.

Parada para descanso no local chamado Bolívia, pouco antes da costa Brava
Na subida da Costa Brava, me senti mal, fadiga, dor de cabeça, caminhei bem devagar e vomitei uma ou duas vezes, acho que além de estar desidratado a altitude me afetou um pouco.
Chegada ao acampamento Plaza de Mulas 4300m
Não fiz nenhuma foto no caminho, pois eu estava muito mal, sem comer direito e ainda com diarreia, terrível a situação, desidratei, mesmo tomando uma boa quantidade de liquidos não conseguia repor.

Lanchonete no acampamento Base Plaza de Mulas

Não dormi bem, acordei várias vezes, mas como o dia seguinte era de descanso não me preocupei muito, acessei a internet, conheci o acampamento, fui ao médico no final do dia, continuei me alimentando mal, isso foi muito ruim, eu estava cada vez mais fraco.

Penitentes, esses blocos de gelo ao lado do acampamento de 4300m


A noite preparamos os equipamentos para no dia seguinte subir ao cerro bonete 5100m, dormi muito mal, acordei de bode, não tomei café direito. Subi me sentindo meio mal, nos 4500, 4600m por ai, paramos para descansar, quando levantei para reiniciar a caminhada, fiquei tonto, conversei com Hormiga, e decidi descer, que caminhada triste eu tive até plaza de mulas, parecia que eu estava grogue, foi difícil caminhar...demorei muito, ao chegar fui ao medico, e levei uma injeção, nem perguntei o que era, fui tentar descansar, todo ferrado....

Visitas ao medico todos os dias...
Não dormi bem de novo nesta noite, decidi ficar descansando, o restante da equipe continuou a aclimatação e partiu para Plaza Canadá 4900m, e retornaram no final do dia, eu ainda não me sentia melhor, ainda bem que o dia seguinte era de descanso, assim eu ficaria mais um dia descansando, porém ser ter feito a subida até Canadá, minha chegada ao cume, estava praticamente condenada!

Neste momento foi que me arrependi de fazer parte de uma expedição comercial aberta, eu precisava mais um dia de descanso, depois subir ao acampamento Canadá 4900m, descer, e somente depois subir novamente para dormir em Canadá uma noite, depois dormir uma noite em  Berlim ou Colera 5900m, Para depois atacar o cume, mas isso nao era possivel, eu precisava seguir o cronograma do restante da equipe, eu atrasei, me ferrei, não poderia fazer nada...comecei a sentir a derrota, de que não chegaria ao cume de jeito nenhum, não conseguia tirar isso da cabeça.

Eu na direita e Padre Mario saindo da Barraca, no Acampamento Plaza Canadá.

Bem, dormi, tomei um com café, estava me sentindo melhor, o problema é que o inicio da escalada estava marcado para as 10:00horas, para mim já é um absurdo começar uma escalada a essa hora, e ainda não sei porque cargas d água, os guias só quiseram iniciar a subida as 12:00 horas, eu não quis comer para o estomago não pesar, e me ferrei no finalzinho da escalada, quase chegando em Plaza Canadá estava exausto e fraco, demorei bastante no ultimo trecho.

Neste momento, você pode optar por contratar porteadores para levar a parte mais pesada do equipamento, é só procurar uma das empresas que dominam o mercado no acampamento base Aymara, Acomara..., fora os itens que seria obrigatório levar em minha mochila, na subida de Plaza de Mulas, a Plaza de Canadá, minha carga ainda pesava 22kg, como estava fudido, optei por pagar um porteador. O custo por um porteador completo(Plaza de Mulas/Canadá - Canadá/Nido - Nido/Colera, fica em torno de U$ 590,00, só para subir), é necessário informar toda a noite a hora de saida no dia seguinte de cada acampamento.

Cheguei em Plaza Canadá, ajudei a finalizar a montagem da barraca, que meu parceiro de barraca Padre Mário já havia feito quase tudo, me joguei na barraca, fiquei tomando líquidos e aguardando o jantar, que neste dia, depois de 4 sem comer direito comi com muito apetite.

Padre Mario, comendo em Plaza Canadá, primeiro dia que comi com gosto. O cardápio era lentilha, legumes com bacon e linguiça calabresa.
Dormi muito bem, acordei as 7:00horas minha água tinha acabado, e apesar do guia ter falado que teria água as 9:00 horas, arrisquei ir ver se já tinha, sai da barraca, o dia estava meio sinistro, com vento, chamei na barraca e o FDP falou em Espanhol algo que não entendi, mas era um palavrão, sei que estava acordando o cara antes do horário combinado, mas eu precisava de água, e o fogareiro estava na barraca deles, eu não tinha saída, fiquei com vontade de meter o pé na barraca mas esperei paciente, congelando do lado de fora. O helicóptero subiu e desceu muitas vezes, fiquei pensando o que era, depois fiquei sabendo que tinha uma pessoa inconsciente na via e uma Japa que tinha congelado a mão em Cólera.

Novamente neste dia, a saída começou atrasada, eu já estava indignado com este sistema de ter de acompanhar todo mundo, achei ridículo na verdade, mas como optei por expedição comercial, respeitei os guias meio engolindo seco e esperei passando frio, porque me agasalhei o suficiente para ficar aquecido caminhando, e estava ali parado. Não era muito frio, mas a noite fez -10 dentro da barraca. O correto seria eu sair antes, pois estava mais fraco que o restante do grupo, mas infelizmente não era assim que funcionava para os guias argentinos, eles queriam todos junto....PUTA MERDA, PORQUE EU COMPREI ESSE PACOTE...começamos a subida, eu com muito frio, não andamos muito, senti minhas pernas fracas estava puto com o sistema que tínhamos de seguir, e sabia que as chances de cume para mim eram pequenas.

Resolvi descer, assim, decidi rápido, falei para o guia, que queria parar para conversar, e assim que ele parou, anunciei minha decisão, todos fizeram cara de que não entendiam o que se passava, Elyse se ofereceu para carregar minha mochila, Padre Mario parecia querer falar algo e me convencer o contrario, e o guia com o rádio na mão só me olhando....disse que queria conversar comigo, mas eu não mudei de ideia, queria descer mesmo!!!!

Momentos depois de minha decisão de descer.

Desci satisfeito com minha decisão, foi rapido, e em um instante eu estava em Plaza de Mulas, organizando minha descida para Puente del Inca para dali dois dias.

Plaza de Mulas visto de cima


Mulas fazendo o trabalho pesado.
 A descida foi com um grupo de Alemães, não falamos nenhuma palavra nas primeiras 4 horas de caminhada, nem eles falavam entre si, povo esquisito!

Descida para Puente del Inca, neste dia caminhei mais de 7hs e 40km

Fiquei com muitas dores no joelho, que duraram mais uns dois dias após terminar a Expedição.
Meu aspecto de detonado ao retornar em Mendoza, fiz essa foto assim que cheguei ao Hotel

Permissão Para subir o Aconcágua.
Foram as melhores férias da minha vida, aprendi muito nessa escalada, tenho certeza que me tornei uma pessoa melhor, é impressionante o que uma aventura dessas faz com nossa mente e corpo.

Agradeço a minha família que me apoiou, ao Padre Mario que sempre foi muito legal, fez uma missa no Acampamento de Plaza de Mulas, foi emocionante, a Elyse que quando decidi desistir de queria a todo custo me ajudar com minha carga, a Hormiga(guia) que me acompanhou quando passei mal na subida da costa brava e na descida do Cerro Bonete, aos médicos do acampamento base e confluência, que apesar de trabalharem em um ambiente tão hostil, dariam aula na maioria dos médicos brasileiros que me atenderam ao longo da vida aqui no Brasil, ao pessoal da http://www.aconcagua6972.com/, pela atenção e carinho que me atenderam na loja, aos guarda parques que sempre me recebiam com um chá ou mate, e muito boa conversa, o povo Argentino realmente é um povo simpático, ao porteador que levou grande parte do peso de meus equipamentos, na subida ao acampamento Canadá e na descida após minha desistência, ver foto abaixo.


Porteador que levou minha carga de Plaza de Mulas a Plaza Canadá, e descida após minha desistência até Plaza de Mulas.


Desejo a todos que consigam um amigo ou parceiro que já tenha feito uma escalada dessas para que não tenham de contratar uma Expedição Comercial em sua primeira experiência em altitude.

Graças a Deus a montanha continua lá, e eu tenha decidido descer a tempo de ter uma nova chance de chegar a seu topo.

"Siga sempre a sua intuição, pois de alguma forma, ela sempre sabe o que você realmente busca".

Dagoberto Ivan